quarta-feira, 30 de julho de 2008
terça-feira, 29 de julho de 2008
Essa exposição que éramos todos nós

Não, não falo de Saramago, que era o protagonista da exposição, falo da exposição em si, da montagem preciosa e rigorosa que Fernando Gómez Aquilera desenhou, que levantou, que nos mostrou para que pudéssemos viver dentro dela. E assim vimos os nossos primeiros livros, aqueles de um papel que se desfazia e amarelecia nas nossas mãos, e vimos revistas que tanto nos ensinaram, e paisagens e rostos que eram os nossos, e emoções que partilhámos… E pensámos, que fazia eu naquele dia? E pusemos datas às recordações, quando o Nobel, quando o Memorial, quando o Evangelho, quando os cinemas de bairro das Pequenas Memórias, quando a Revolução, e quando uma folha seca mas brilhante que marcava uma data numa agenda… Fomos sendo nós próprios em A Consistência dos Sonhos, rodeados de letras, de todos os nomes, de pedras de Lanzarote e de retratos. Esta exposição que agora estão desmantelando não é a vida duma pessoa, é a soma das experiências de tantos leitores que estavam, cada experiência e cada leitor, nas páginas dos mil livros, nas fotografias, numa partitura, num cartaz, num vídeo em inglês ou em português, ou em outro com acento de Brasil… Era a exposição consistente do formoso acto de encontrar-se, não de escrever ou de ler, mas de habitar num mesmo universo, o nosso universo. Que agora levam, e dói, claro que dói, embora saibamos que pela sala da Ajuda continuarão a circular emoções como se fossem ecos de tantos sentimentos experimentados.
A consistência dos sonhos já não está em Lisboa. Outros países receberão o trabalho da Fundação César Manrique, de Lanzarote. E agora, apesar da pena, só resta manifestar alegria por tê-la visto, por ter podido participar na festa de a percorrer uma e outra vez, como se fosse um corpo, o corpo acolhedor e sugestivo que era. A Fundação César Manrique fez um bom trabalho, Fernando Gómez Aguilera, o comissário, fez um bom trabalho, os técnicos de Lanzarote fizeram um bom trabalho. E o Ministério da Cultura de Portugal, com o ministro à frente, fez um bom trabalho: soube o ministro compreender que o que estava acontecendo em Lanzarote devia entrar nas casas e nos corações dos portugueses, e assim se pôs a trabalhar para que o Palácio da Ajuda estivesse disponível e com as portas abertas de par em par para quantos quisessem experimentar a paixão íntima e deslumbrante do conhecimento partilhado. A todos eles, artistas, técnicos, gestores, representantes políticos, por ter-nos permitido esta gozosa experiência, obrigado de todo o coração.
Depois de termos visitado A Consistência dos Sonhos sabemos que a vida é maior, que a realidade vai mais além que o que a nossa vista alcança. Também sabemos que nos custará aceitar que esse património cultural e emotivo, assim disposto, já não estará em Lisboa para ser experimentado ao cair da tarde. Ou seja, sabemos que a exposição terá de regressar a Portugal porque de Portugal faz parte. Comecemos, pois, a sonhar de novo, agora que ficou claro que os sonhos são consistentes e têm muita força.
Pilar del Río
Esa exposición que éramos todos

No, no hablo de Saramago, que era el protagonista de la exposición, hablo de la exposición en sí, del montaje precioso y preciso que Fernando Gómez Aguilera diseñó, que levantó, que nos mostró para que pudiéramos vivir en él. Y así vimos nuestros primeros libros, aquellos de papel que se deshacía y amarilleaba en nuestras manos, y vimos revistas que tanto nos enseñaron, y paisajes y rostros que eran los nuestros, y emociones que compartimos… Y pensamos ¿qué hacía yo este día? Y le pusimos fecha a recuerdos, a cuando el Nobel, a cuando Memorial, a cuando el Evangelio, a cuando los cines de barrio de Las pequeñas memorias, a cuando la Revolución y a cuando una hoja seca pero brillante marcaba una fecha en una agenda… Hemos ido siendo nosotros en La consistencia de los sueños, nosotros rodeados de letras, de todos los nombres, de piedras de Lanzarote y de retratos. Esta exposición que ahora desmantelan no es la vida de una persona, es la suma de las experiencias de tantos lectores que estaban, cada experiencia y cada lector, en las páginas de los mil libros, en las fotos, en una partitura, en un cartel, en un vídeo en inglés o en portugués o en otro con acento de Brasil… Era la exposición consistente del hermoso acto de encontrarse, no de escribir ni de leer, sino de habitar un mismo universo, nuestro universo. Que ahora se llevan y duele, claro que duele, aunque sepamos que por la sala de Ajuda seguirán circulando emociones como si fueran ecos de tantos sentimientos registrados.
La consistencia de los sueños ya no está en Lisboa. Otros países recibirán el trabajo de la Fundación César Manrique de Lanzarote. Y ahora, pese a la pena, solo queda manifestar alegría por haberla visto, por haber podido participar en la fiesta de recorrerla una y otra vez, como si fuera un cuerpo, como el cuerpo acogedor y sugestivo que era. La Fundación César Manrique hizo un buen trabajo, Fernando Gómez Aguilera, el comisario, hizo un buen trabajo, los técnicos de Lanzarote hicieron un buen trabajo. Y el Ministerio de Cultura de Portugal, con el Ministro al frente, hizo un buen trabajo: supo el ministro cerciorarse de que lo que estaba pasando en Lanzarote debía de entrar en las casas y en los corazones de los portugueses y se puso a trabajar para que Ajuda estuviera disponible y con las puertas abiertas de par en par para quienes quisieran experimentar la pasión íntima y deslumbrante del conocimiento compartido. A todos ellos, artistas, técnicos, gestores, representantes políticos, por habernos permitido esta gozosa experiencia, gracias de todo corazón.
Después de haber visitado La consistencia de los sueños sabemos que la vida es más grande y que la realidad va más allá de lo que alcanza nuestra vista. También sabemos que nos costará aceptar que ese patrimonio cultural y emotivo, y así dispuesto, ya no estará en Lisboa para ser experimentado a la caída de la tarde. O sea, sabemos que la exposición tendrá que regresar a Portugal porque forma parte de Portugal. Empecemos, pues, a soñar de nuevo, ahora que nos han puesto de manifiesto que los sueños son consistentes y tienen mucha fuerza.
Buen viaje, Exposición, buena travesía y hasta pronto.
domingo, 27 de julho de 2008
Viva o povo brasileiro - Reacção de José Saramago à atribuição do Prémio Camões a Ubaldo Ribeiro
sexta-feira, 25 de julho de 2008
Últimos dias de A Consistência dos Sonhos no Palácio da Ajuda

Para assinalar o encerramento da exposição, terá lugar no dia 27, pelas 19 Horas, um concerto de violoncelo executado por solistas da Orquestra Metropolitana de Lisboa. De acordo com o Instituto dos Museus e da Conservação (IMC), o concerto, de entrada gratuita e pelas 19:00, será realizado pelo duo de violoncelos Franz Ortner e Ana Cláudia Serrão.
Do programa fazem parte a Sonata n.º 1 para Dois Violoncelos de Georg Philipp Telemann (1681-1767), Bulerias, de Mario Escudero (1928-2004), Sonata para Dois Violoncelos de Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), Sonata para Violoncelo Solo, de Gyorgy Ligeti (1923-2006).
Serão ainda interpretados o tema popular brasileiro "O Surdo", de Totonho e Paulinho Rezende, e "Julie-o", de Mark Summer.
José Saramago: A Consistência dos Sonhos pelo olhar de Isabel Coutinho
in Ciberescritas
quarta-feira, 23 de julho de 2008
A Fundação José Saramago e o Centro Andaluz del Vidrio em Castril de la Peña, Granada, Espanha
Graças à iniciativa da Fundação José Saramago, do município de Castril e dos fundos obtidos através de instituições andaluzas, pôs-se em marcha um projecto que pretende recuperar e manter viva a tradição do trabalho em torno do vidro, arte que deu a conhecer Castril de la Peña à Europa e ao mundo, já que peças saídas das mãos dos criadores de Castril podem ser vistas nos museus mais importantes. Actualmente, no Centro é dada formação a cerca de 20 pessoas, que se iniciam nas artes do vidro soprado e noutras técnicas, e que serão os obreiros da indústria do vidro, tão reclamada durante anos.
O Centro e o trabalho que ali se realiza merecem uma visita, mas para quem não possas deslocar-se até Castril, pode ver este vídeo de apresentação que mostra as primeiras peças saídas do Centro Andaluz del Vidrio, já nesta data uma prometedora realidade.
Con el objetivo de recuperar la pérdida industria del vidrio, se ha puesto en marcha una iniciativa que dará trabajo y visibilidad a una zona económicamente deprimida.
Gracias a la iniciativa de la Fundación José Saramago, del Ayuntamiento de Castril y con los fondos obtenidos de las instituciones andaluzas, se ha puesto em marcha un proyecto que pretende recuperar y mantener viva la tradición del trabajo en torno al vidrio, arte que dio a conocer Castril de la Peña en Europa y el mundo entero, ya que piezas salidas de las manos de los creadores de Castril se pueden ver en los museos más importantes. Actualmente en el centro se imparte formación a cerca de 20 personas, que se inician en las artes del soplado del vidrio y otras técnicas, y que serán quienes pongan en marcha la industria del vidrio, tan reclamada durante años. El centro y el trabajo que allí se realiza merece una visita, pero para quien no pueda desplazarse hasta Castril, puede ver este video de presentación que muestra las primeras piezas salidas del Centro Andaluz del Vidrio, ya en estas fechas una prometedora realidad.
sexta-feira, 18 de julho de 2008
Concerto de violoncelo no encerramento da exposição José Saramago: A Consistência dos Sonhos

Do programa fazem parte a Sonata n.º 1 para Dois Violoncelos de Georg Philipp Telemann (1681-1767), Bulerias, de Mario Escudero (1928-2004), Sonata para Dois Violoncelos de Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), Sonata para Violoncelo Solo, de Gyorgy Ligeti (1923-2006).
Também irão interpretar o tema popular brasileiro "O Surdo", de Totonho e Paulinho Rezende, e "Julie-o", de Mark Summer.
Com centenas de documentos, fotografias, pinturas e notas pessoais do Nobel da Literatura, a exposição "José Saramago - A Consistência dos Sonhos" recebeu cerca de 5.400 visitantes durante o primeiro mês em que esteve patente, após ter sido inaugurada a 23 de Abril.
Organizada pela Fundação César Manrique, a exposição é comissariada por Fernando Gómez Aguilera, e esteve inicialmente em Lanzarote (Canárias) - onde foi inaugurada em Novembro do ano passado -, tendo sido ampliada com mais documentos provenientes da Biblioteca Nacional de Portugal (BNP) e pinturas criadas por artistas que se inspiraram na obra de José Saramago.
"A Consistência dos Sonhos" conta com uma forte componente multimédia, recorrendo a suportes digitais e audiovisuais, e exibe um conjunto de documentos inéditos do espólio do escritor laureado com o Nobel da Literatura em 1998.
"José Saramago: A Consistência dos Sonhos" - apresentada em Lisboa com o apoio e organização do Ministério da Cultura através do Instituto Português de Museus (IMC), a BNP e a Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas (DGLB) - vai estar patente na Galeria D. Luís até 27 de Julho.
A exposição estará aberta, de segunda-feira a domingo (excepto quarta-feira), das 10:00 às 19:00.
Fonte: LUSA
quarta-feira, 16 de julho de 2008
A Casa dos Bicos e a Fundação José Saramago

A Fundação José Saramago, com a maior gratidão e o maior orgulho, fará tudo para manter o bom e o excelente que esse edifício guarda e propagá-lo até onde cheguem as suas possibilidades. E, se tal estiver ao nosso alcance, a Fundação José Saramago tentará acrescentar história à grande História da Casa dos Bicos com a sua actuação diária no campo da Cultura, do Pensamento, dos Direitos Humanos, do Meio Ambiente, de matérias não tangíveis, mas que nos fazem ser desta maneira e não de outra. Para isso nascemos.
A Fundação José Saramago, feliz por esta concessão da Câmara Municipal de Lisboa, agradece e expressa a sua disposição para ser útil a todos, tal como claramente se encontra expressado na Declaração Fundacional e nas normas estatutárias.
Fundação José Saramago
Última hora - Aprovada cedência da Casa dos Bicos para Fundação Saramago

O protocolo entre a autarquia lisboeta e a fundação será assinado quinta-feira às 15:30, no salão nobre dos Paços do Concelho, com a presença de José Saramago.
Fonte: LUSA
segunda-feira, 14 de julho de 2008
A Maior Flor do Mundo pelos olhos das crianças
sexta-feira, 11 de julho de 2008
Jorge de Sena na Antena 1 e Antena 2
Podem ouvir-se poemas de Jorge de Sena, ditos pelo próprio, e declarações de Jorge Fazenda Lourenço sobre a obra e sobre o homem.
quinta-feira, 10 de julho de 2008
Hoje, dia 10 de Julho, no Teatro Nacional de São Carlos, 21.30 Horas
- Leitura de poemas por Jorge Vaz de Carvalho
- Recital de piano por António Rosado
- Leitura de depoimento de Mécia de Sena
- Intervenções de Eduardo Lourenço, Vítor Aguiar e Silva,
Jorge Fazenda Lourenço, António Mega Ferreira e
José Saramago
- Encerrará a sessão o Ministro da Cultura,
José António Pinto Ribeiro
Entrada livre, condicionada pela lotação da sala
Organização: Fundação José Saramago,
com a colaboração do Ministério da Cultura
Apoio: Biblioteca Nacional de Portugal,
Teatro Nacional de São Carlos
O reencontro de José Saramago com Jorge de Sena 47 anos depois
Na sexta-feira passada, em sua casa, José Saramago relembrou os tempos em que conheceu e se correspondeu com Jorge de Sena e começou por dizer que "a vida é lixada!". Depois, arrependeu-se da palavra e achou que se deveria encontrar outra para definir a vida e, principalmente, a morte porque "não só nos empurra brutalmente para fora da vida, mas tem, muitíssimas vezes, outra consequência que é uma outra espécie de morte que se chama esquecimento".
É contra esta situação que a Fundação José Saramago realiza esta noite uma sessão/debate para tornar mais presente na cultura nacional a obra daquele escritor. Para Saramago, Jorge de Sena "não está esquecido. Continua a ter muitíssimos leitores e a atenção dos estudiosos - académicos ou não - na obra poética e de ficção e alguns na área do ensaio".
Sobre o relacionamento de ambos, após 1961, o escritor recorda-o assim: "Eu conheci o Sena, sem qualquer espécie de intimidade a não ser aquela que resultou de quando ele se foi embora de Portugal porque fazia traduções para a Editorial Estúdios Cor (onde José Saramago trabalhava)." Posteriormente, "ele veio a Lisboa uma vez ou duas, uma por ocasião de um congresso de escritores em que casualmente ficámos sentados um ao lado do outro e conversámos. Depois de 1974, os contactos romperam-se porque não publicámos nada mais dele", acrescenta.
Desses tempos, o escritor realça ainda "uma característica raríssima num grande tradutor, e eu não conheço outro caso, a de a cada tradução acrescentar um estudo sobre esse livro" e uma outra, a de ser "o tipo de pessoa que eu aprecio porque é frontal e expressivo".
Quanto ao evento de hoje à noite, Saramago não acredita que seja "uma espécie de passe de mágica que vá transformar essa situação (de alguma indiferença) numa completamente diferente, com Portugal inteiro correndo às livrarias à procura dos livros do Jorge de Sena - coisa que estaria muito bem se o fizesse -, mas não sejamos ingénuos".Para Novembro, estão previstas novas conferências com o Nobel. Depois de Jorge Luis Borges, os próximos autores são José Rodrigues Miguéis, Raul Brandão - "um escritor muito melhor e maior do que aquilo que se convencionou" - e Almada Negreiros, "responsável pela segunda grande revolução estilística na nossa língua e literatura".
João Céu e Silva, in DN de 10.07.2008
terça-feira, 8 de julho de 2008
Entrevista de Pilar del Río ao DN - 2.ª parte

Riquíssimo de glórias e de honra…
É um património que equivale ao que ganham alguns executivos por mês. O autor ganha um xis de cada livro, daí ainda paga imposto e, portanto, há que vender muitos milhões de livros. E não é o caso de Saramago, isso são os autores de best-sellers, porque Saramago é um autor de culto. Deixemo-nos de fantasias de que os escritores são muito ricos, será talvez a senhora que faz o Harry Potter mas, insisto, nunca como os grandes executivos.
A Fundação José Saramago nasce na democracia e para a democracia, mas como não temos fontes de financiamento próprias – não nos nasce petróleo como na Gulbenkian – nem uma potência económica por trás, antes uma soma de muitas vontades tal como aquelas que puseram a voar a passarola do Memorial do Convento, as que realizam os grandes projectos. Essa é a nossa riqueza, ter um patrono como Saramago que sabe que do solo se pode levantar o melhor e o pior. E temos a disposição, energia e uma ideia muito clara da nossa responsabilidade. De que como cidadãos intervimos e nos organizamos ou neste mundo e com esta economia não existe saída.
Não colaborar no sonho de Saramago seria se cúmplice do abandalhamento generalizado e, como detestamos a cultura como adorno nas casas dos ricos, queremos antes homens sábios em todas as esquinas. Isso é democracia. Quanto ao resto, não estamos para tal.
Estamos a organizar-nos bem, ou tão bem como podemos, para que a Fundação não seja um sonho de uma noite de verão. Para que dentro das suas capacidades e dos seus limites – toda e qualquer organização tem os seus limites – se prepare esta Fundação para fazer tudo aquilo que possa e se possível ainda alguma coisa mais para que a cultura se manifeste em todo o seu esplendor e contradições. Somos uma Fundação, repito, para cidadãos e não para consumidores. Não podemos ir até à lua, não temos tecnologia, capital ou desejo, mas poderemos descobrir o seu lado oculto porque contamos com o melhor do mundo: a vontade humana.
Esta Fundação não nasceu para cuidar da obra de Saramago, ela está em todo o mundo e quem trata dela é a sua agente literária. O que queremos fazer é discutir as ideias porque nos fóruns que os poderes realizam, ou nos dos governos, não se quer que nenhuma ideia se solte e tenha efeito? Onde é que estão os fóruns livres? Este é um deles.
Sim, muitíssimas. Enviei uma mensagem a muitos amigos que colocaram nas suas respectivas páginas a ligação com o nosso site e recebemos respostas inesperadas.
É uma preocupação de Saramago, portanto, é uma preocupação da Fundação.
Sim, mas a presidenta assume o espírito da Fundação, que é o espírito que Saramago passa. Como iríamos viver tranquilamente a ler estupendos livros se o mundo está feito uma merda? Eu não posso ler rodeada de porcaria.
Não, o próximo livro de Saramago é importante para a literatura, porque terá aumentado o seu património. Para os leitores, porque temos um livro mais. E enquanto é bom para os demais é bom também para a Fundação.
Que é muito bom.
É diferente dos últimos e mais parecido com alguns dos primeiros. É um livro saramaguiano, cem por cento saramaguiano.
segunda-feira, 7 de julho de 2008
Entrevista de Pilar del Río ao DN - 1.ª parte

Há um ano que é presidente da Fundação José Saramago...
Presidenta!...
Presidenta?
Só os ignorantes é que me chamam presidente. A palavra não existia porque não havia a função, agora que existe a função há a palavra que denomina a função. As línguas estão aí para mostrar a realidade e não para a esconder de acordo com a ideologia dominante, como aconteceu até agora. Presidenta, porque sou mulher e sou presidenta.
Mas a palavra não existe!
Porque é que entre uma mulher e um animal tem primazia o género do animal? Porque dizem "Vêm os dois" se é uma mulher e um cão quem vem? Em vez de dizerem que não se pode dizer presidenta, mas ministra sim, solucionem essa injustiça e canalhice. Que os doutos académicos resolvam um conflito que tem séculos porque não têm sensibilidade para apreciar a questão ou nem se aperceberam. Por isso, justificam com leis gramaticais ou simplesmente silenciam e riem-se das pretensões da mulher porque se acham superiores. Em quê?
Ser presidenta da Fundação que tem o nome de Saramago é uma grande responsabilidade?
Sim...
Principalmente tendo em conta que José Saramago é um nome muito polémico em Portugal!
Não. Saramago não é um nome polémico em Portugal. Saramago é um dos três ou quatro portugueses mais amados que há em Portugal. Pode ser que em algum meio, com facilidades de acesso à comunicação social, não se goste de Saramago, mas Saramago também não gosta dessas pessoas. Saramago não é polémico, é muito amado.
Mas o nome Pilar também é muito polémico...
Não. O nome de Pilar não existe em Portugal. Por amor de Deus, dê-me essa alegria hoje, diga-me que sim! Minta-me! Não existe, não, não há polémica comigo porque não tenho repercussão pública.
Não concordo com isso!
Então, porque é que eu sou polémica?
Porque a maior parte dos portugueses a olham como a mulher que foi responsável por levar José Saramago para Espanha.
Não, foi o Governo de Cavaco Silva! Dê outra razão...
Por ter opiniões muito próprias e não ter qualquer problema em as afirmar.
Os inteligentes adoram encontrar personagens com opinião própria, os ignorantes é que não.
Não quer ser politicamente correcta?
Não.
Porquê?
Se a Igreja Católica não tem problemas em defender o que defende, de dizer que as pessoas têm de morrer sem cuidados paliativos e todas essas coisas que vão contra o senso comum...
É mais fácil lidar com os leitores portugueses ou com os leitores espanhóis?Os leitores são bons leitores em Portugal e em Espanha. Alguns jornalistas de alguma comunicação social têm um grande problema com o tamanho do seu ego - para não dizer o tamanho de outra coisa - e estão zangados porque não podem suportar que haja um ser que seja querido, transgressor, escreva bem e seja reconhecido. Mas este não é problema dos leitores, é de umas quantas pessoas que tentam criar opinião, só que a opinião pública não é o mesmo que a opinião publicada.
Considera que a imprensa em Portugal não é livre e serve os interesses de certos grupos?
Penso que a imprensa não é livre no mundo inteiro e cada dia existem mais grupos de pressão que, economicamente, têm de atender muitas frentes. Por isso há cada vez mais boletins informativos e menos jornais e todos respondem a um pensamento politicamente correcto porque o que sai daí não existe e os jornalistas também não oferecem resistência. Os jornalistas são de maneira geral muito mal pagos, salvo as estrelas, e têm muita dificuldade em ter opinião própria. Fazem o que pensam que irá agradar às suas empresas.
Também é jornalista. Sente essas pressões?
Sim, claro.
Consegue ser livre no programa na rádio?
Claro, eu consigo porque tenho muitíssimos anos de trabalho e porque sei que no final acabam sempre a dizer "são coisas da Pilar". Tratam de reduzir-me a uma anedota mais ou menos simpática, mas sei que sou a cereja sobre o bolo.
Pode dizer-se que é uma espécie de Manuela Moura Guedes, muito interventiva?
Não! Entre o jornalismo que faz Manuela Moura Guedes e o que eu faço há uma diferença porque são duas escolas. Ela intervém, interrompe, ataca. Eu deixo falar, porque parece-me que deixando falar a outra pessoa é quando ela se mostra em absoluto. Sou totalmente contra essa forma de fazer jornalismo que é perguntar, perguntar e isso parece-me frequente aqui em Portugal.
Porque é que ainda se mantém jornalista?
Porque aprendi a ler aos sete ou oito anos num jornal e desde então soube que queria ser jornalista. Gosto de contar as coisas e de ser uma intermediação entre o que acontece e as pessoas.
Ainda é de uma geração em que acha que a imprensa podia mudar o mundo?
Não, eu penso que são os seres humanos que têm capacidade para mudar o mundo e não os jornalistas. Não me contento em ser uma notária e fazer registos, nunca fiz um jornalismo neutro e enjoa-me, vomito no jornalismo neutro. Faço um jornalismo que assina a notícia, que vê o mundo de uma maneira determinada e não se conforma com dizer as coisas reconhecidas ou o que recebe das grandes agências. No entanto, o jornalismo não muda o mundo, mas os jornalistas não podem ser tão idiotas que reproduzam o discurso dos centros de poder como costumam fazer.
Fazem um jornalismo neutro?
Jornalismo neutro é o que supostamente aspiram fazer ao contar o que acontece. Um momento genial foi quando o Fidel Castro esteve no Porto e os jornalistas pareciam ser as pessoas mais democratas que existiam no mundo e avançaram contra o senhor Castro com várias perguntas, ao que ele respondeu com outras questões: quantos anos estudaram jornalismo? É uma carreira universitária? Cobram muito? E a resposta foi: "Estamos num país democrático."
Fidel Castro é democrata?
Na Europa, todos os governantes que governam para seu benefício próprio e não para o povo são democratas? Berlusconi é um democrata? Bush é um democrata? Quem massacra um povo como o do Iraque é um democrata? E vão dizer "mas Fidel não deixa sair as pessoas da ilha" e os do Iraque podem sair? E os portugueses que passam necessidades podem partir?
Sabe-se que aprecia muito Hugo Chávez...
Seguramente não é a pessoa com quem vou tomar café à tarde. Tanto faz que goste ou não, mas é a pessoa que está a pôr água e luz nas casas onde não havia, faz escolas e preocupa-se com a saúde. Aplaudo isso e está a repartir a riqueza de um país em que só se dividia a pobreza. Se nunca tivesse tido água em casa, nem luz, nem escola, nem saúde, votaria em Chávez todos os dias.
De que ideologia gosta?
Não é a que gosto, é a que tenho!
Em que partido se inscreveria?
Evidentemente que seria um partido de esquerda, mas não me pergunte qual porque hoje está tudo em mudança. Sempre fui votante do Partido Comunista até que o Partido Socialista (PSOE) me reclamou e eu respondi porque, em alguns momentos, por responsabilidade tinha de estar lá. Mas encontro-me muito bem com a Esquerda Unida de Llamazares apesar de ter votado no Partido Socialista em algumas ocasiões. Esta coisa de o voto ser secreto é outra história de que havia muito para falar. Quer-se secreto porque temos de ocultar a ideologia.
Mas hoje em dia vota em Zapatero?
Não. Voto em algumas ocasiões no PSOE e noutras na Esquerda Unida.
Em Portugal, votaria em qual?
Votaria Partido Comunista, mas nas eleições autárquicas votaria Manuel Maria Carrilho e depois António Costa. E porque não teria votado no Partido Comunista? Queria assegurar que os socialistas governassem, que fosse a esquerda.
Acredita que os partidos comunistas espanhol e português têm futuro nos tempos que correm? A esquerda tem sentido?
Sim, a esquerda é necessária mesmo que os grandes grupos de pressão digam que é uma ideia antiquada. Os "democratas" das grandes empresas e multinacionais acham e conseguem com o seu poder mediático impressionante que se considere que a esquerda não tem futuro, mas as pessoas têm cada vez mais necessidades, dívidas, angústia e problemas para viver e isto o patrão não irá solucionar.
E a União Europeia resolvê-los-á?
Sim... (ri-se) A União Europeia com Berlusconi e Sarkozy irá mesmo resolver muitos problemas...
E a Europa de Zapatero e Sócrates?
Não, porque vão ser isolados. Quem manda é essa coisa tão patética e ridícula chamada Berlusconi e do género e irão fazer o possível por isolar os partidos socialistas.
E Mariano Rajoy também é tipo Berlusconi?
Não, por Deus, não! Mariano Rajoy é uma pessoa de quem pessoalmente gosto mas representa interesses que não são os meus e tem posições perante o mundo que não são as minhas. Respeito-o.
O PP de Mariano Rajoy está num grande debate sobre se volta ao centro...
E por uma razão muito simples, é que supostamente nessa massa amorfa que é o centro é onde está a maior fonte de votos. Creio que ele quer vir a ser centro para refundar o que foi a UCD de Adolfo Suárez.
Mas está a ter grande contestação interna?
A Esperanza Aguirre é uma política e tem toda a legitimidade em querer ser a líder do Partido Popular. E como o diz claramente isso agrada-me.
As mulheres na política são como os homens, melhores ou piores?
As mulheres nunca podem ser iguais aos homens. Não são homens! E os homens não podem ser iguais às mulheres.
A actual ministra das Forças Armadas de Espanha voltou ao trabalho, seis semanas depois de ter sido mãe... Isso é ser diferente?
Não. Esteve grávida, regressou e o seu marido está de baixa a cuidar do menino.
Zapatero tem no Governo várias mulheres...
Porque é esperto. Porque é inteligente.
Só por essas razões?
Claro. Se vai fazer uma equipa de pessoas que trabalhem com ele - que não estejam a trabalhar para eles mesmos - e que trabalhem para a sociedade, então encontra nesse grupo de mulheres quem trabalhe para a sociedade e menos para elas mesmas. Estamos habituadas a ter de trabalhar para os filhos que temos.
Mas não considera que as mulheres trabalham melhor do que os homens?
Trabalhamos mais, melhor e em várias coisas de cada vez.
Essa possibilidade feminina de trabalhar em várias coisas ao mesmo tempo é um mito...
Vamos lá ver, conte as coisas que já fez hoje. (Faço a lista e responde) Parece uma mulher (risos)
Como é que se porta o homem lá de casa?
Essa é outra história. Estamos a falar de um tempo distinto, um trabalho distinto, uma circunstância distinta. Não responde ao cânone.
Zapatero abraça todas as bandeiras gay. Para ganhar votos ou porque acredita?
Zapatero abraça as bandeiras que são direitos humanos e veio corrigir um défice democrático. E a legalização dos casamentos homossexuais é um défice democrático.
O casamento homossexual não a preocupa?Porquê?
É muito pior e mais complicado para a vida matrimonial os homens com barriga.
Nos EUA tivemos agora uma mulher e um afro-americano a disputar a presidência…
Um negro!
O que lamento é que a mulher não tenha ganho as primárias. Nos EUA, os negros conseguiram o direito a voto em todos os estados antes das mulheres. Esse senhor tem uma cor diferente mas agradava-me que fosse uma pessoa que fizesse uma mudança qualitativa e por muitíssimas razões que fosse Hillary Clinton. Porque está cheia de ira e de raiva e porque tem um domínio das coisas, mas as pessoas deixaram-se levar pelo discurso muito bonito e poético de Obama.
Entrevista de João Céu e Silva
Fotografia de Rui Coutinho
Publicada no Diário de Notícias de 06 de Julho de 2008
sexta-feira, 4 de julho de 2008
A Consistência dos Sonhos. Uma visita virtual

quarta-feira, 2 de julho de 2008
Concerto na Galeria do Rei Dom Luís I
A entrada é livre.
terça-feira, 1 de julho de 2008
Curso livre em torno da obra de José Saramago no Palácio da Ajuda

10 de Julho
11.30 - Maria Isabel Rocheta
12.15 - Dialogismo e encontro de culturas em História do Cerco de Lisboa
14.30 - José Manuel Mendes
15.15 - Entre romances: os Cadernos de Lanzarote
15.30 - Miguel Real
16.15 - Saramago e o romance histórico português
11 de Julho
11.30 - Paula Morão
12.15 - O Ano da Morte de Ricardo Reis, de Saramago: percurso na cidade de Lisboa
Almoço na Estufa real, Calçada da Ajuda
14.30 - Ana Paula Arnaut
15.15 - José Saramago: da (in)consistência da História à consistência dos sonhos
15.30 - José Manuel Mendes
16.15 - As palavras - Leitura de textos de José Saramago
Inscrições gratuitas até 7 de Julho:
saramago.expo@dglb.pt
Tel. - 21 798 21 43 ou 45
Fax - 21 798 21 41
Almoço na esplanada do restaurante Estufa Real (28€)
Jardim Botânico da Ajuda, Calçada da Ajuda
Inscrição prévia nos mesmos contactos
Ao clicar na imagem, pode ver o programa em tamanho real