Na sexta-feira passada, em sua casa, José Saramago relembrou os tempos em que conheceu e se correspondeu com Jorge de Sena e começou por dizer que "a vida é lixada!". Depois, arrependeu-se da palavra e achou que se deveria encontrar outra para definir a vida e, principalmente, a morte porque "não só nos empurra brutalmente para fora da vida, mas tem, muitíssimas vezes, outra consequência que é uma outra espécie de morte que se chama esquecimento".
É contra esta situação que a Fundação José Saramago realiza esta noite uma sessão/debate para tornar mais presente na cultura nacional a obra daquele escritor. Para Saramago, Jorge de Sena "não está esquecido. Continua a ter muitíssimos leitores e a atenção dos estudiosos - académicos ou não - na obra poética e de ficção e alguns na área do ensaio".
Sobre o relacionamento de ambos, após 1961, o escritor recorda-o assim: "Eu conheci o Sena, sem qualquer espécie de intimidade a não ser aquela que resultou de quando ele se foi embora de Portugal porque fazia traduções para a Editorial Estúdios Cor (onde José Saramago trabalhava)." Posteriormente, "ele veio a Lisboa uma vez ou duas, uma por ocasião de um congresso de escritores em que casualmente ficámos sentados um ao lado do outro e conversámos. Depois de 1974, os contactos romperam-se porque não publicámos nada mais dele", acrescenta.
Desses tempos, o escritor realça ainda "uma característica raríssima num grande tradutor, e eu não conheço outro caso, a de a cada tradução acrescentar um estudo sobre esse livro" e uma outra, a de ser "o tipo de pessoa que eu aprecio porque é frontal e expressivo".
Quanto ao evento de hoje à noite, Saramago não acredita que seja "uma espécie de passe de mágica que vá transformar essa situação (de alguma indiferença) numa completamente diferente, com Portugal inteiro correndo às livrarias à procura dos livros do Jorge de Sena - coisa que estaria muito bem se o fizesse -, mas não sejamos ingénuos".Para Novembro, estão previstas novas conferências com o Nobel. Depois de Jorge Luis Borges, os próximos autores são José Rodrigues Miguéis, Raul Brandão - "um escritor muito melhor e maior do que aquilo que se convencionou" - e Almada Negreiros, "responsável pela segunda grande revolução estilística na nossa língua e literatura".
João Céu e Silva, in DN de 10.07.2008